terça-feira, 29 de setembro de 2009

Festival do Rio - 500 noites de amor

BELLINI E O DEMÔNIO – Segunda adaptação de uma aventura do detetive Remo Bellini, criado pelo Titã Tony Bellotto, para o cinema (a primeira, Bellini e a esfinge, de 2001, ganhou o Troféu Redentor). Já há um terceiro livro, Bellini e os espíritos, que logicamente também irá virar filme. Não gosto da primeira história, excessivamente longa, lenta demais e dispersiva em sua narrativa fria, mas que segue direitinho a cartilha do cinema noir. Esta nova aventura de Bellini desenvolve-se em um clima bem mais dark, quase opressivo, por vezes angustiante, vai direto ao ponto (é bem curta, tem apenas 85 minutos). Não conheço o romance, mas é evidente também que muita coisa precisou ser suprimida ou resumida, o que pode gerar certa incompreensão por parte do espectador. Foi o último trabalho de Fábio Assunção antes de sua internação em uma clínica de recuperação da dependência química; de fato, o ator parece estar mesmo sob o efeito de alucinógenos, compondo com perfeição um atormentado e desesperançado detetive particular, sempre abatido, com barba por fazer, longe do galã que ficou conhecido pelas novelas globais. Sua atuação é visceral, imprimindo ainda mais impacto à narrativa, que não prima pela linearidade – é preciso ficar atento aos desdobramentos temporais para entender a trama. Há óbvias referências a O último portal e Coração satânico. A bela Rosane Mulholland, musa da vez do cinema nacional, faz a jornalista Gala, que auxilia Bellini na investigação sobre uma garota morta no banheiro do colégio, o que desencadeia uma perigosa busca por um livro misterioso, que conteria segredos ocultos. Podem apontar várias falhas no filme, mas a verdade é que me envolvi com a história, o filme prendeu minha atenção até a última cena. Marília Gabriela aparece quase ao final, morena e de cabelo curto, num papel pequeno, mas importante. O final pareceu rápido e abrupto demais. * * *

O CORREDOR NOTURNO – Entrou de última hora na minha programação (o filme original que ia assistir não foi liberado e escolhi outra sessão) e, combinando com o improviso, também cheguei em cima da hora à sala, já com os créditos de abertura na tela. Um executivo do ramo de seguros enfrenta problemas profissionais e familiares quando conhece um homem misterioso, que o ajuda a resolvê-los. Ele recusa o auxílio, mas livrar-se de seu novo amigo vai ser uma tarefa quase impossível. Baseado em romance homônimo do argentino Hugo Burel (editado pela Alfaguara), este poderia ser uma fábula sobre a moral no universo corporativo, com a figura do Sr. Conti funcionando como a voz da consciência do empresário (Leonardo Sbaraglia), sempre aparecendo nos momentos de crise mais intensa. No entanto, o bom ponto de partida se dilui por força de um roteiro frouxo, que não aprofunda os conflitos so protagonista nem se preocupa em desenvolver melhor a figura do amigo misterioso. O que será ele? Um fantasma? A própria consciência personificada? Uma metáfora das relações de poder? A definição fica a cargo de cada espectador. Pessoalmente, as primeiras referências que me vieram à mente foram dois contos de Rubem Fonseca, Passeio noturno (sobre um empresário que sai de carro pela noite atropelando pessoas – no filme, para aliviar a tensão, o executivo sai para correr à noite) e O outro (em que um cidadão comum não consegue se livrar de um pedinte), mas o filme nada tem a ver com nenhum deles. * *

500 DIAS COM ELA – Este foi o Pequena Miss Sunshine do festival deste ano: um filme que chegou sem alarde, meio na surdina, escondido no meio da programação (inclusive já com data de estréia definida, o que costuma espantar o espectador que gosta de garimpar pérolas), também independente (mas distribuído pela Fox), sem grandes nomes no elenco. E que consegue conquistar a platéia graças a um roteiro primoroso, inteligente, que faz um retrato sensível e realista das relações afetivas que se desenvolvem nos tempos atuais. O jovem Tom (Joseph Gordon-Levitt, da série 3rd rock from the sun) trabalha escrevendo cartões de felicitações, embora seja formado em Arquitetura (o que já provoca a imediata empatia do público, é um desvio profissional muito comum hoje em dia). Ele sempre acreditou no amor, em alma gêmea (o que é explicado logo no começo, ele teria entendido errado A primeira noite de um homem!). Sempre solitário, vê sua vida ganhar um novo sentido ao conhecer Summer (Zooey Deschanel, de carreira ascendente, linda como sempre), a nova assistente do escritório. Aos poucos, vão descobrindo várias afinidades. Tom se apaixona, mas Summer é exatamente o seu oposto: não acredita no amor, não quer compromisso sério. A narrativa avança e recua no tempo, ao longo dos tais 500 dias em que durou o relacionamento entre eles, mostrando as diversas etapas do namoro, momentos alegres, brigas, reconciliações, enfim, a vida tal como a vivemos. Com ótima montagem, trilha sonora espetacular e eclética, recheada de canções pop românticas que marcaram época (tem de The Smiths a Carla Bruni!), o filme tem também ótimos diálogos e boas sacadas visuais, como o pastiche musical após a primeira transa do casal ou a separação da tela em dois planos, o da realidade e o da expectativa, antes de um encontro entre ele e sua amada. O diretor Marc Webb, egresso dos videoclipes, mostra que é cinéfilo e presta uma bela homenagem à sétima arte, com uma especial seqüência em que satiriza filmes franceses (e também faz uma alusão muito bem humorada a O sétimo selo). Mas erra ao oferecer um final convencional. Embora possa provocar gargalhadas, é um filme a que se assiste com um ligeiro aperto no coração, por desnudar, de forma simples e direta, as misteriosas engrenagens que movem o amor. Se eu não estivesse em um momento afetivo particularmente muito bem resolvido, provavelmente teria derramado muitas lágrimas no cinema. Para ser visto por casais de todas as idades. O filme pode ser finalista em várias categorias do Oscar. Delirantemente aplaudido no final da sessão. * * * * *

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