quarta-feira, 31 de março de 2010

A caixa

O diretor Richard Kelly se tornou conhecido do público cinéfilo por conta de seu primeiro filme, o cultuado Donnie Darko (2001), estrelado por Jake Gyllenhall e Drew Barrymore. O filme, um suspense apocalíptico e enigmático, até hoje rende acaloradas discussões nas listas da internet graças a seu roteiro intrincado e engenhoso. Mas o que poderia representar o surgimento de um novo grande nome do cinema norte-americano não se confirmou, e Kelly passou os anos seguintes no ostracismo. Reapareceu em 2006 com um equívoco abissal, o inqualificável Southland tales – O fim do mundo. Mas agora se recupera com outro trabalho asfixiante, A caixa, no qual volta a exercitar sua habilidade na construção de uma história formada de diversas camadas narrativas, mas com um único vértice conversor.

Como em seu filme de estréia, este aqui também se passa nos anos 70, mais precisamente em 1976. Num belo dia, a professora Norma Lewis (Cameron Diaz, já evidenciando a idade) recebe a visita do misterioso Arlington Steward (Frank Langella), um homem horrivelmente mutilado por uma espécie de queimadura que lhe destruiu parte do rosto. Ele leva consigo uma caixa e lhe faz uma proposta: se ela apertar o botão que há no objeto, ganha um milhão de dólares; porém, ao mesmo tempo, em algum lugar do mundo, uma pessoa morrerá. Norma leva a questão a seu marido, Arthur (James Mardsen), um discreto funcionário da Nasa. Instintivamente, ela pressiona o botão, recebe a recompensa, mas, a partir daí, suas vidas entram em uma espiral de estranhos acontecimentos. Paralelamente, Arthur descobre informações sobre o passado de Steward, que pode estar diretamente ligado a um episódio ocorrido na Nasa alguns anos antes.

O roteiro, baseado em um conto do especialista Richard Matheson, que já forneceu matéria-prima para muitos outros filmes de Hollywood, consegue construir um clima tenso e sufocante na maior parte do tempo, sempre alimentando a dúvida do espectador a respeito da identidade daquele homem estranho, o que o move realmente, e qual a finalidade de suas experiências. Assim, o espectador mais atento vai descobrir logo o mistério da trama, que não chega a ser tão surpreendente, mas, até chegar lá, haverá boas doses de suspense, com alguns sustos e muito clima. No entanto, é esse mesmo roteiro que quase põe tudo a perder lá pelo meio, com uma cena particularmente ridícula (que acontece após a reunião na biblioteca), inclusive com o que me pareceu um erro grosseiro de montagem. Mas o diretor comprova sua competência segurando a história, evitando que ela descambe para o absurdo absoluto que chega a ameaçar.

O final cíclico é carregado de uma crueldade extrema, mas dá o que pensar e faz o espectador sair do cinema com várias questões morais na cabeça. E isso já é muito para um filme nos dias de hoje.

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