Aos 27 anos, o jovem Adam é um
radialista em carreira ascendente. Mora numa casa bacana e tem uma linda
namorada ruiva. Tudo vai bem na sua vida, até descobrir que é portador de um
raro tipo de câncer na coluna. Suas chances de sobreviver ao exaustivo tratamento
são de exatos 50%. Começa, então, um espetáculo de lágrimas e desespero, e o
que era bem-humorado no começo se perde em uma chorumela insuportável. Certo?
Bem, se esta fosse mais uma
adaptação de obra de Nicholas Sparks, seria até provável. Mas este filme, 50%, foi uma das boas surpresas do
começo do ano nos Estados Unidos, recebendo críticas bastante favoráveis.
Estranhamente, porém, foi esnobado pela Academia, que o rejeitou na hora de
distribuir as indicações, mesmo sendo melhor do que pelo menos metade dos
indicados ao prêmio principal, mas não passou despercebido pelo Globo de Ouro,
que lhe conferiu duas nomeações. Mais estranho ainda é que não tenha encontrado
espaço no circuito exibidor nacional, sendo relegado à prateleira de DVDs (é
aquela velha história: para cada American
pie que ocupa 300 salas pelo país, uma jóia como essa fica no limbo). E,
embora o filme seja apresentado como uma comédia dramática, não há muito em que
pensar na hora de classificá-lo nas locadoras.
O grande lance do roteiro é,
simplesmente, tratar os personagens como seres humanos comuns, iguais a eu,
você, nossos amigos e familiares. Assim, tudo no filme obedece à lógica
fracionária do título: nada é inteiramente bom ou ruim. Ao mesmo tempo em que Adam magnetiza a
piedade da platéia, também age como um filho desnaturado, que foge dos contatos
telefônicos da mãe por não agüentar sua preocupação excessiva e fingir
“desconhecer” a condição do pai, que tem Alzheimer – ou seja, não deixa de
provocar também certa antipatia, assumindo um comportamento condenável,
“lavando as mãos”. A doce namorada de Adam, que no começo se mostra apaixonada
e disposta a tudo para sustentar seu amor, também não é o que parece. O melhor
amigo tenta levantar-lhe o astral, levando-o a festas, mas usa seu estado de
saúde para sensibilizar garotas e dormir com elas.
A psicóloga (com quem Adam se recusa a tratar a princípio, por ser mais nova do que ele!) mostra-se
insegura no começo, mas cresce, como pessoa e como profissional, ao longo dos
encontros com seu paciente, e é responsável por uma das cenas mais duras do
filme, quando condena o comportamento evasivo de Adam em relação à mãe (“Ela já
não pode conversar com o marido, e agora também não tem você. Está sozinha no
mundo e só tenta apoiá-lo, mas você a rejeita”). Essa dualidade também
transparece na própria montagem da narrativa, que começa de forma bem-humorada,
cede espaço para o drama, sem jamais cair na pieguice, equalizando ambas as
situações, evitando que a fita se torne nem tão dramática a ponto de soar
exagerada e insuportável de assistir, nem tão engraçada de forma a cair na
grosseria. Uma qualidade admirável, um equilíbrio muito raro de se atingir,
sobretudo hoje em dia. Bola
dentro.
Contribuem para o ótimo nível do
filme as boas atuações, quase todas no ponto. Joseph Gordon-Levitt confirma o
talento que despontou em 500 dias com ela
e compõe um protagonista muito humano, na medida certa entre a esperança e o
desespero, o que lhe valeu uma indicação ao Globo de Ouro de Melhor Ator em
Comédia ou Musical (mesmo que 50% não
seja nem uma coisa nem outra!). Anjelica Huston faz a mãe amorosa que esconde
suas dores sem se alterar em momento algum. Anna Kendrick (a amiga de Vera Farmiga
em Amor sem escalas) empresta doçura
e firmeza necessárias à psicóloga residente. Bryce Dallas Howard (sempre linda
e fiel ao seu estilo, mudando de cara e penteado a cada novo filme) empresta a
ambigüidade adequada ao papel.
Mas o
grande nome, para mim, é Serge Houde, veteraníssimo ator canadense, geralmente coadjuvante,
com quase 130 filmes no currículo – você pode nem se lembrar dele, mas
certamente já o viu em O pagamento de
John Woo, O dia em que a Terra parou com
Keanu Reeves, Por amor com Michelle
Pfeiffer – que interpreta o pai alienado do mundo por força de sua doença
incurável. Uma grande presença, capaz de marcar o tom do personagem apenas com
a vaguidão do olhar ou a inércia de ações (apesar de eu achar sua última cena
equivocada, parecendo negar a natureza do seu Richard). A curva fora do mapa é
Seth Rogen, que exagera na grosseria como o melhor amigo, conta piadas sexistas
e trata as mulheres como objetos. Parece estar em uma daquelas comédias
adolescentes que lhe deram fama, não em um drama sério e consistente. Falta-lhe
humanidade, embora sua justificativa final redima o personagem.
Uma promissora estréia de Will
Reiser como roteirista (ele também interpreta Greg) e direção segura de
Johnatan Levine (sem nada importante no currículo, antes fez Doidão, que só passou aqui no Festival
do Rio, e o suspensinho Tudo por ela).
Também nos faz questionar o tipo de relacionamento que mantemos com as pessoas
que nos são queridas e próximas, que hoje estão ali, amanhã podem não estar. Emocionante,
bonito e bem realizado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário