quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Os jogos de Truman

13 desafios (2006)

Não é um filme exatamente novo (foi rodado em 2006) e já recebeu inúmeras críticas e resenhas em diversos sites e blogues espalhados pelo ciberespaço. Mas só fui descobri-lo agora (eu sempre tenho a impressão de que sou o último a saber de certas coisas) e o efeito me foi tão devastador que achei justo dividi-lo com os eventuais leitores deste espaço, que também já devem conhecê-lo. O fato é que este 13 desafios, mais do que uma gratíssima surpresa, foi também outra prova de vitalidade do cinema tailandês, que raramente dá as caras por aqui, mas é um dos mais intensos do mundo hoje.

O que você faria para ganhar uma alta quantia em dinheiro? Com este princípio mais do que surrado, o roteiro desenvolve uma espiral de acontecimentos de tirar o fôlego, garantindo o suspense até a última cena. Puchit é um jovem que atravessa uma fase conturbada em sua vida. Acabou de ser demitido, terminou o namoro com uma cantora e ainda sofre pressão financeira da família. Sem perspectivas, vê sua vida mudar quando atende despreocupadamente a um telefonema. Do outro lado da linha, um interlocutor misterioso avisa que ele foi escolhido para participar de um game show e que se realizar 13 tarefas, cada uma com grau de dificuldade mais elevado que a anterior, ao final, receberá em sua conta o montante de cem milhões em dinheiro (o depósito dos prêmios é confirmado pelo visor do celular). Puchit pode desistir do jogo a qualquer momento... Mas ele segue em frente, mesmo diante dos absurdos que vai encontrando pelo caminho. Começa de forma inocente, quando lhe é pedido que mate uma mosca. Depois, a coisa vai piorando, envolvendo bizarrices (como, literalmente, comer merda em um restaurante chique) e assassinatos.

Quando a gente se depara com um bom filme realizado em outro país, sempre imagina que vai haver e fica esperando a refilmagem norte-americana. Neste caso, porém, parece que a idéia original já foi feita antes, e justamente em Hollywood. A primeira referência que vem à cabeça é Vidas em jogo (1998), de David Fincher, em que Michael Douglas participa meio sem querer de uma competição mortal comandada por um ensandecido Sean Penn. Mas no caso de 13 desafios a coisa vai ainda mais além, mesclando de forma radical os limites entre realidade e ficção. Ficamos nos perguntando o tempo todo se o que estamos vendo é mesmo só um jogo ou se o protagonista enveredou por algum tipo de loucura auditiva, transformando sua própria vida em uma competição sem garantia alguma.

Puchit topa tudo por dinheiro. Até matar.
A engenhosidade do roteiro também me fez estabelecer outras equivalências. Pela natureza narrativa e a forma como a história se desenvolve, é como se houvesse uma combinação dos elementos centrais de O show de Truman com o sadismo do primeiro Jogos mortais (vale lembrar que o filme inicial da série foi saudado como renovador do gênero, pleno de criatividade e tensão, depois é que a fórmula se esgotou). Puchit é alertado o tempo todo de que está participando de um jogo, um reality game, com direito à platéia. Ou seja, tem sua vida constantemente monitorada e, em tese, transmitida para uma audiência ávida pelo seu próximo passo. Ao mesmo tempo, ele precisa superar etapas que se revelam exercícios de sadismo e violência, jogando também com a vida de outras pessoas. Há ainda pinceladas de Oldboy, na medida em que acontecimentos do passado influem e justificam certas escolhas do personagem.

A montagem dinâmica garante a fluência da narrativa, que é valorizada pela trilha sonora climática e a fotografia contrastante, que opõe os ambientes claros e limpos da “vida real” (no escritório, na rua) com outros escurecidos e sujos do “jogo” (casos da seqüência na casa e da estrada, à noite). O roteiro só derrapa um pouquinho quase no final, com a revelação da estrutura do jogo, mas isso não empana o brilho de 13 desafios. No fundo, a mensagem é clara e aterradora. Somos, todos nós, jogadores involuntários, que alimentamos a violência e a crueldade do mundo, de uma forma ou de outra. Um filmaço para fazer pensar. 

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