quinta-feira, 28 de março de 2013

No escurinho da Semana Santa


Antigamente, a Semana Santa era uma data que chamava ao recolhimento e à reflexão. Os cristãos aproveitavam a oportunidade para se encerrarem em retiros espirituais enquanto se mantinham longe dos diversos prazeres mundanos. É claro que a essência da Semana Santa se desvirtuou e hoje ela é apenas mais um feriadão que as pessoas aguardam com ansiedade para poderem desfrutar de quatro dias de sol, mar e chocolate. Mas há outra tradição relacionada à data que se mantém ao longo dos anos. Nessa época os canais de TV sempre exibem algum filme sobre a vida de Cristo ou que tenha alguma relação com as histórias bíblicas. As locadoras estão abarrotadas de ótimas opções, mas vale destacar algumas, para quem quiser curtir o feriado prestigiando a Sétima Arte, entre uma oração e um pedaço do ovo da Páscoa.

BEN HUR - Não trata diretamente da vida de Cristo, mas a Semana Santa é um período perfeito para conhecer ou rever este que é um dos grandes filmes de todos os tempos, clássico absoluto, detentor de 11 Oscars. Épico em todos os sentidos da palavra. A famosa seqüência da corrida de bigas envolveu mais de 8.000 figurantes e levou 94 dias para ser rodada. Hoje seria facilmente refeita em computador, o que torna o resultado visto aqui ainda mais impressionante.

A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO - Uma das obras-primas menos lembradas de Martin Scorsese, este filme ficou marcado pela polêmica à época de seu lançamento, no final da década de 80. Condenada pela Igreja Católica, que não gostou de ver as dúvidas existenciais de um Cristo inseguro de sua missão, a fita foi alvo de boicote em vários países ao redor do mundo, inclusive no Brasil, onde foram registrados piquetes nas portas dos cinemas que a exibiam. Mas o filme nada tem de blasfemo nem trata a figura de Cristo com o propalado desrespeito, ao contrário, é sempre reverente. Mas Scorsese colheu mais louros que espinhos, e por este trabalho recebeu sua segunda indicação ao Oscar.

A PAIXÃO DE CRISTO - Nunca se viu uma historia sobre Jesus contada com tanto sangue e violência quanto nessa igualmente polêmica (mas por outras razões) versão de Mel Gibson. O diretor se defendeu, alegando que estava sendo o mais fiel possível às escrituras, segundo as quais Cristo teria sofrido barbaridades de fato. Porem, o que se vê na tela é um exercício de sadomasoquismo exagerado e apelativo. Campeão mundial de críticas negativas, mesmo assim bateu recordes de bilheteria e foi agraciado com três indicações ao Oscar, uma delas inexplicável, para a maquiagem, que é visivelmente deficiente. Saiu depois em uma caprichada edição dupla em DVD.

JESUS DE MONTREAL - Um pouco diferente dos demais por não apresentar uma encenação tradicional da história de Cristo. Neste filme do futuramente premiado canadense Dennis Arcand (de As invasões bárbaras), uma trupe teatral encena a vida do Messias e passa a enfrentar sérios problemas quando o diretor surta. O terço final do filme, em que a trupe encena a vida de Cristo pelas ruas de Montreal, é um dos pontos altos da narrativa.

A MAIOR HISTÓRIA DE TODOS OS TEMPOS - Há pelo menos três filmes com o mesmo título ou subtítulo no mercado nacional. Este aqui é a superprodução dirigida por George Stevens em 1965, quando Hollywood se esmerava em produzir espetáculos visuais sérios, voltados a uma platéia mais adulta, sem as parafernálias técnicas que hoje entretém o público mas disfarçam a fragilidade de sua realização. Custou 20 milhões de dólares, uma quantia espantosa na época, e recebeu cinco indicações ao Oscar (mas perdeu em todas). No numeroso elenco, destaque para Max Von Sydow e Carroll Baker.

GOSPEL ROAD - A STORY OF JESUS - É no mínimo uma grande curiosidade ver essa versão da vida de Cristo narrada pelo cantor Johnny Cash, quando ele estava em sua "fase negra". Também produtor e roteirista, Cash vai contando passagens bem conhecidas da história bíblica, como o julgamento da adúltera, a tentação no deserto, as criancinhas, até chegar logicamente à crucificação. Ele alterna o texto declamado com algumas canções de inspiração religiosa, muitas de sua autoria, enquanto atores desconhecidos representam dramaticamente os momentos em questão. O próprio diretor do projeto, Robert Elfstrom, interpreta Jesus, e June Cash faz Maria Madalena - é dela, aliás, o melhor momento musical, entoando "Follow me". Filmado em locações autênticas em Israel, tem belas imagens, mas um hibridismo de gêneros que gera resultado insatisfatório: não conta uma história de forma tradicional, não funciona como documentário, nem é bem um musical. Mas é sempre respeitoso e reverente à figura de Cristo. Fãs de Cash e católicos fervorosos, porém, vão gostar bastante.

A VIDA DE BRIAN - Um dos grandes momentos do grupo Monty Python, embora não seja o meu favorito deles. Os três reis magos erram o caminho para a manjedoura e, sem querer, vão parar na casa de Brian, que nasce no mesmo dia e na mesma hora que Jesus Cristo. Ao longo da vida, ele será constantemente confundido com o Criador. Os cristãos mais radicais não gostam dessa versão bem-humorada e a acusam de ser blasfema, mas a verdade é que em momento algum a figura de Cristo é ridicularizada, muito ao contrário. A graça é justamente acompanhar as peripécias por que passa o pobre do Brian.

MARIA - Delírio de Abel Ferrara sobre uma atriz de televisão que interpreta o papel da Virgem Maria e passa a confundir ficção e realidade. Variação de um tema já explorado outras vezes, com resultado confuso, passou quase em branco nos cinemas e nem chegou a causar tanta polêmica. Mais uma boa presença de Juliette Binoche, conferindo dignidade ao papel título.

JE VOUS SALUE, MARIE - Essa provocação de Jean Luc Godard também foi proibida no Brasil por ordem expressa do então presidente José Sarney (que depois voltou atrás e retirou o veto). Como sempre, o diretor francês abusa de metáforas e simbologias para contar a história, em que Maria e José são trabalhadores comuns (ela jogadora de basquete, ele taxista) e cujo filho é uma criança comum, sem qualquer dom espiritual especial. A edição em DVD, curiosamente, não traz o curta-metragem que acompanhava o filme quando lançado em VHS.

O MANTO SAGRADO - Outra produção classe A, dos tempos em que Hollywood gastava mais dinheiro com idéias do que com efeitos especiais e tecnologia 3D. Uma visão diferente da vida de Cristo, a partir da história do Santo Sudário e sua guarda por um escravo romano até ser usado para cobrir o corpo do Salvador crucificado. Indicado a cinco Oscars, incluindo melhor filme, ganhou os de Figurinos e Direção de Arte.

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